domingo, outubro 03, 2010

Época dos prémios literários III - o Nobel

Observações gerais

Os problemas do Nobel da literatura são os conhecidos:

- escandinavos merecidamente obscuros nos primeiros anos

- aquele ano em que o júri se premiou a ele mesmo (1974 - o equivalente ao tesoureiro ir servir-se da conta da sociedade, que o prémio também é dinheiro - e muito)

- escolhas politicamente correctas nos últimos anos

- omissões escandalosas em geral

Mas o que me chateia mais é o prémio ter deixado de ser atribuído a ensaístas/filósofos e historiadores. Era das poucas vantagens que tinha sobre outros prémios puramente literários.

O novo Secretário Permanente da Academia Sueca, Peter Englund (que fez uma triste figura o ano passado ao anunciar o nome da vencedora em pose revisteira de mão na anca), é um historiador, com trabalho de grande qualidade na área da História Militar, e poderia ao menos sugerir à Academia que voltasse a galardoar um ensaísta ou um historiador ao fim de várias décadas sem o fazer (os últimos foram Churchill, em 1953, e Sartre, em 1964), mas pelo que diz quem sabe, não tem qualquer influência sobre as decisões da Academia quanto ao Nobel da literatura.

Prognósticos só depois do resultado

A avaliar pelas apostas na Ladbrokes, a fuga de informação anual indica aparentemente o nome do queniano Ngugi wa Thiong'o.

O ano passado, o meu palpite era o de que Agota Kristof ou Dubravka Ugresic poderiam bem ganhar, e no fim quem ganhou foi também uma escritora da Europa Central, pelo que não errei por muito.

Este ano, ignorei os persistentes rumores no sentido de que o vencedor irá ser um poeta, muito por em 2009 a Academia Sueca ter dito que Herta Müller tinha ganho o prémio Nobel devido tanto à sua prosa como à sua poesia, o que para todos os efeitos dispensava a Academia da difícil tarefa de galardoar um poeta, pelo menos por alguns anos.

Tendo em conta quantos anos passaram desde que a Academia Sueca entregou pela última vez o prémio a um autor de língua castelhana, pressupus que está na altura de o voltarem a fazer. E tendo em conta também o quanto o prémio Nobel da literatura tende a favorecer escritores que foram vítimas de censura, repressão ou perseguições (ou que as utilizaram como tema), bem como os autores dotados do perfil nobelizável de Grande Senhor da Literatura com intervenção pública humanista em favor de causas nobres (excluíndo assim os autores reclusos como o Pynchon, com convicções políticas questionáveis como Céline - sim, eu sei, Hamsun, mas ele ganhou o Nobel muito antes de apoiar os Nazis - ou mesmo apenas com uma visão pessimista da humanidade como Houellebecq - sim, eu sei, não é bom o suficiente para ganhar o Nobel; só está aqui como exemplo), o meu palpite para este ano era Jorge Semprún, uma vez que o perfil nobelizável lhe assenta como uma luva, com (qualquer) um dos irmãos Goytisolo sobreviventes como suplente. Se o vencedor for com efeito Ngugi wa Thiong'o, errei mesmo por muito.

Mas o fixe, mesmo fixe, era que

A Academia Sueca desse o Nobel à Stephenie Meyer e depois entrasse em liquidação.

R-E-S-P-E-C-T

No Boletim da Ordem dos Advogados desta semana vem publicada (p. 77) uma carta de um advogado ao bastonário queixando-se do i-na-dmi-ssí-vel insulto de que tinha sido objecto porque um cliente não o tinha tratado por "Senhor Dr.", e por o último Boletim ter sido endereçado não ao "Senhor Dr. Zé das Couves" mas simplesmente ao "Zé das Couves" (o horror!).

Eu até aqui pensava que o respeito não consistia apenas em utilizar fórmulas ocas e em mostrar falsa reverência nos momentos tidos por adequados. Que o respeito (para além da civilidade mínima que todos merecemos) era uma coisa que se tinha que ganhar, de que qualquer pessoa se tem de mostrar digna, e não algo a impor por decreto. Se calhar estava enganado.

Época dos prémios literários II - o Booker

Jã vão na lista final:

Parrot and Olivier in America - Peter Carey
Room - Emma Donoghue
In a Strange Room - Damon Galgut
The Finkler Question - Howard Jacobson
The Long Song - Andrea Levy
C - Tom McCarthy

Seca.

O livro do Peter Carey já foi traduzido para português.

Época dos prémios literários I - o Goncourt

A primeira selecção:

Olivier Adam - Le coeur régulier
Vassilis Alexakis - Le premier mot
T. Beinstingel - Retour aux mots sauvages
Vincent Borel - Antoine et Isabelle S.
Virginie Despentes - Apocalypse bébé
Marc Dugain - L'insomnie des étoiles
Mathias Enard - Parle-leur de batailles, de rois et d'éléphants
Michel Houellebecq - La carte et le territoire
Maylis de Kerangal - Naissance d’un pont
Patrick Lapeyre - La vie est brève et le désir sans fin
Fouad Laroui - Une année chez les Français
Amélie Nothomb - Une forme de vie
Chantal Thomas - Le testament d'Olympe
Karine Tuil - Six mois , six jours

Nothomb e Houellebecq - as duas grandes celebridades da literatura francesa em duelo pelo prémio!1!11!

Pelo menos até esta 3ª feira, quando a Academia Goncourt fizer a segunda selecção (ver calendário). Não me espantaria que um deles ou mesmo os dois fossem à vida.

A respeito do Michel Houellebecq, leia-se a recente entrevista da Paris Review, onde ele dá mostras de uma perspicácia, de uma candura e de uma consciência dos defeitos e dos méritos da sua própria obra ao alcance de poucos. Bónus: malha no Le Clézio.

A Amélie Nothomb pode ser a mulher mais feia da Cristandade, e ser também decididamente infantaria ligeira em termos literários, por assim dizer, mas eu até gostei dos livrinhos dela que cheguei a ler, e não me importava que ganhasse. Já há alguns anos que os seus livros deixaram de ser traduzidos em Portugal, e podia ser que uma vitória no Goncourt levasse os editores portugueses a darem-lhe uma nova oportunidade.

À parte estes dois e a Virginie Despentes, conhecida por ter realizado um filme de sacanagem muito pretensioso e muito tolo há uns anos, não conheço mais ninguém nesta lista. Melhor do que no ano passado, em que nunca tinha ouvido falar de ninguém logo na lista da primeira selecção.

domingo, setembro 19, 2010

Santa ingenuidade



O meu primeiro pensamento quando vi esta capa: "Fixe! Será sobre ténis?"

A coragem de transgredir



Passei pela frente do televisor hoje ao início da tarde e a entrevistada do Só Visto! era a turboapresentadora Filomena Cautela, nesse exacto momento prestando contas pela sua "irreverência".

O que hoje em dia, depois do Jornal Nacional das sextas-feiras da TVI e na era das entrevistas quase confrontacionais com os titulares dos mais altos cargos, se entende por "irreverência" acaba por ser quase sempre aquele cool chocarreiro, alarve e aldrabado em que se especializaram por exemplo a SIC Radical e a Loja do Cão Azul. Ou o 5 para a Meia Noite, o tipo de programa que tem em teoria por público alvo os jovens em idade universitária e acaba por ser visto principalmente por rapazes de 14 anos (sem ofensa para todos os rapazes de 14 anos que já sabem o suficiente para não perderem tempo com aquilo). Mas todos temos de ganhar o nosso dinheirinho e fazer as nossas carreirinhas, e deste programa por si não resultam danos demasiado graves para o processo de construção do Portugal socialista. Adiante.

Filomena Cautela até começou por dizer algo como "Não me considero irreverente." "Vai bem. Ao menos ainda ninguém usou a palavra 'transgressão'. Continue, que a alguém com esses olhos eu estou disposto a perdoar muita coisa.", pensei eu. Para logo depois cair a bomba: "Não há muita gente a fazer o que eu faço. Porque têm medo."

Felizmente que, em contraste a vil cobardia da esmagadora maioria dos seus pares, a heróica Filomena, enfrentando censuras e ditaduras e com risco para a sua própria vida, tem a coragem de, um serão por semana, nos proporcionar uma edificante dose de humor cócó-chichi, sketches amadorísticos, hiperactividade inconsequente e "irreverente" comentário social do nível da pita muita maluca que se vangloria de ter colado um burrié nos estofos do BMW Série 3 do primo Salvador Maria. Ainda há quem tenha a coragem de transgredir.

quinta-feira, abril 29, 2010

Barcelona = EPIC FAIL

O jogo de ontem expôs as limitações do modelo de jogo do Barcelona.

Para começar, parece ser um estilo de jogo que pura e simplesmente não funciona quando para o colocar em prática só restam jogadores física e mentalmente exaustos depois de uma longa época.

Mas o problema principal é que parece considerar a posse de bola como um fim em si mesmo. O que funciona quando a equipa está em vantagem, mas não quando necessita (desesperadamente) de marcar. Durante todo o jogo, o Barcelona pareceu estar satisfeito com passar a bola de um jogador para o outro milhentas vezes em câmara lenta, como se os golos de que precisava se fossem marcar a eles mesmos. Jogadores habitualmente tão clarividentes como Xavi pareciam mais preocupados em não falhar quaisquer passes do que em criar desequilíbrios e oportunidades de golo.

Quanto ao Inter, jogou com 10 da mesma maneira como jogaria com 11. Estacionou o autocarro como tinha de fazer.

terça-feira, março 23, 2010

Mal menor

Justiça poética

Legendagem e dobragem

Tive há pouco tempo o que não foi tanto uma discussão sobre os méritos relativos de legendagem e dobragem como um "apontar com o dedo e rir" colectivo à custa da Espanha e dos seus samurais a falar castelhano.

Seja como for, teria valido a pena a opção pela legendagem só para ver escrita no ecrã a solução genial encontrada por quem traduziu e legendou os Monty Python para a RTP para traduzir groupie ("uma fã que dá baldas").

sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Política, por uma vez

Isto do caso TVI é o exemplo perfeito do tipo de coisa que entusiasma o meio jornalístico até ao delírio mas de que mais ninguém quer saber (e com razão).

domingo, dezembro 20, 2009

Erratas, aditamentos, coisas que já não foram a tempo

Errata

O texto final foi revisto por mim próprio linha a linha apenas uma vez, já depois de impressas as primeiras provas. Ainda assim, parece-me que o número de gralhas tipográficas remanescente é reduzido/aceitável. Sempre que encontre alguma gralha que prejudique a compreensão do texto, darei conta dela aqui no blogue.

Na p. 205 caiu uma linha de texto. O último parágrafo deveria ler-se "a preocupação de avançar rapidamente e tentar logo que possível forçar uma batalha campal decisiva em condições favoráveis"

Erro factual

A "batalha naval travada diante de Bizâncio" mencionada na p. 107 (a batalha de Calípolis) foi travada não em 323 mas em 324, e não no Bósforo mas sim no Helesponto.

Bibliografia não referida no livro

Nas notas de rodapé, cito repetidamente Rostovtzeff, mas por alguma razão esqueci-me de aditar a referência à bibliografia final. A edição que consultei (na biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) foi:

ROSTOVTZEFF, Michael - The Social & Economic History of the Roman Empire - Oxford, Clarendon Press, 1926

A edição portuguesa de The Fall of the Roman Empire, de Michael Grant (Roma - A Queda do Império) foi publicada tarde demais para ser considerada neste livro. Uma edição em língua inglesa surge listada no catálogo da biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, mas quando me desloquei lá não a consegui encontrar.

Tanto a obra de Adrian Goldsworthy How Rome Fell (aparentemente também publicada sob o título The Fall of the West: The Death of the Roman Superpower) como a de Edward Luttwak The Grand Strategy of the Byzantine Empire surgiram já depois da data em que entreguei a versão final do texto junto da Editora Prefácio.

Argumentos que deveria ter desenvolvido mais

Deveria ter abordado expressamente o problema das consequências da divisão do Império do ponto de vista político e estratégico. A existência de dois imperadores, em Roma/Ravena e em Constantinopla, não seria só por si e à partida um factor de fraqueza e divisão. Dois imperadores, cada um com um exército sob as suas ordens, poderiam em teoria defrontar duas ameaças externas em simultâneo. Mas a verdade é que os dois impérios tinham a tendência para apenas se auxiliarem mutuamente quando os imperadores nos tronos ocidental e oriental pertenciam à mesma dinastia. Aliás, a divisão do Império Romano em Império do Ocidente e do Oriente pressupunha essa identidade dinástica entre ambas as capitais; as duas divisões do Império mais significativas do século IV viram dois irmãos subir ao trono de Roma e de Constantinopla: em 364, Valentiniano e Valente; em 395, Honório e Arcádio. Em várias ocasiões durante o século V, o Império Romano do Oriente interveio no ocidente não para auxiliar o imperador de Roma a defrontar invasores bárbaros, mas para o depor e substituir por um imperador "legítimo".

Mas então o que é que vem no livro?

Como as livrarias online portuguesas não têm ainda, que eu saiba, aquela engenhoca "click to look inside!" das Amazons, e é sempre bom poder folhear, ainda que virtualmente, um livro, vou colocar aqui um índice abreviado e uma ideia do que consta de cada capítulo, até porque o conteúdo do livro é mais abrangente do que o seu título poderá dar a entender.

Primeira Parte: A República Romana (508 a.C. - 27 a.C.) - pp. 29-51
- breve descrição do exército romano e da sua evolução durante o período
- exposição esquemática das principais linhas da acção estratégica romana durante a época da expansão por toda a bacia do Mediterrâneo (guerras púnicas, guerras com os estados helenísticos, expansão na Península Ibérica) e mais tarde durante o período dos grandes senhores da guerra de finais do último século da República e das guerras civis
- também breve discussão do problema das motivações do expansionismo romano na época áurea das grandes conquistas da República.

Segunda Parte: o Principado (27 a.C. - 284 d.C.) - pp. 53-74
- discussão do problema da efectiva existência de uma "estratégia" por parte dos decisores políticos e militares romanos desta época (debate entre Luttwak, os seus apologistas e os seus críticos)
- breve descrição do exército romano e da sua evolução durante o período
- exposição esquemática das principais linhas da acção estratégica romana durante a época de Augusto e dos seus sucessores (27 a.C. - 69 d.C.), sob os imperadores flávios e no século II (69-193) e durante a grande crise do século III

Terceira Parte: o novo sistema imperial: o Dominado - pp. 75-86
- exposição das reformas políticas, fiscais e administrativas de finais do século III/início do século IV
- descrição das reformas militares de Diocleciano
- descrição das reformas militares de Constantino

Quarta Parte: o exército romano do século IV d.C. - pp. 87-125
- secção introdutória sobre a Notitia Dignitatum
- descrição detalhada do exército romano após a realização das reformas expostas na secção anterior, incluindo a guarda imperial, os exércitos de campanha (desdobramento, organização, unidades que os compunham), as forças de guarnição fronteiriça ou limitanei (organização, missões e o problema da sua eficácia militar), a marinha, o recrutamento, o comando e as condições de serviço

Quinta Parte: estratégia de defesa fronteiriça - pp. 127-151
- aspectos gerais das fortificações e da defesa fronteiriça romanas durante os séculos III a V d.C.
- o funcionamento da fronteira romana
- três exemplos de fronteiras romanas (norte de África, o Litoral Saxónico no canal da Mancha e no Mar do Norte, e a região do Mar Negro), com a descrição das defesas, dispositivo militar e estratégia contra as ameaças específicas de cada região

Sexta Parte: o exército romano no Ocidente no século V d.C. - pp. 153-165
Nesta parte do livro é discutida a questão da dita "barbarização" do exército romano, e do seu eventual contributo para a queda do Império Romano no Ocidente.

Sétima Parte: estratégia total - pp. 167-179
- aspectos da organização romana ao nível logístico e da informação
- a estratégia total de Diocleciano
- a estratégia total de Constantino, com apreciação crítica da mesma

Oitava Parte: aspectos específicos da estratégia romana - pp. 181-205
- a estratégia romana nas campanhas contra os bárbaros
- a estratégia romana nas campanhas contra os Persas
- a estratégia dos contendores nas guerras civis romanas

Nona Parte: a estratégia do Império Romano do Ocidente durante o século V d.C. - pp. 207-230
- narrativa (por vezes descontínua) dos acontecimentos entre 405 e 476 d.C., com apreciação críticas das opções estratégicas tomadas por Estilicão, Honório, Flávio Constâncio, Aécio e Majoriano

Décima Parte: observações finais sobre a queda do Império - pp. 231-242
- digressão historiográfica sobre as causas tradicionalmente apontadas como determinantes da queda do Império Romano no Ocidente
- conclusões da análise estratégica efectuada sobre o problema

Auto-promoção


Disponível desde meados de Dezembro nas livrarias - que eu tenha visto, nas FNACs, nas Bertrand(s?) e no El Corte Inglés. Nas livrarias online também: Bertrand; Bulhosa; Wook.

"Capa mole" (não sei até que ponto isto soa melhor do que "brochado"), 264 páginas, 22 ilustrações, 6 mapas a cores.

Conto colocar aqui durante os próximos dias material adicional sobre o livro.

domingo, abril 09, 2006

9 de Abril

Em 9 de Abril de 1918, o Corpo Expedicionário Português na frente ocidental foi atacado e na sua maior parte destruído por forças alemãs na que é conhecida como a batalha de La Lys.

Mais informação disponível neste artigo (em inglês) da minha autoria no site da Great War Society:

Portugal in the Great War

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Bases de dados mais l33t do que a Legião Estrangeira

A Biblioteca do Conhecimento Online é de uma cromice completa. O site é confuso e as FAQ's e manuais do utilizador indecifráveis, cheios de expressões como "agregadores de conteúdos", "motores de pesquisa federados" e "plataforma de investigação integrada" que seriam cómicos se não houvesse gente a receber dinheiro para escrever estas coisas.

Todo o site está escrito numa mistura insólita e indigesta de l33tspeak e burocratês.

Os cromos que fizeram isto deviam dar uma vista de olhos pela base de dados JSTOR para verem como uma base de dados deste tipo pode e deve ser feita.

quarta-feira, dezembro 07, 2005

Mais publicidade gratuita

Uma das bloguistas que já beneficiou de publicidade gratuita neste blog mudou de casa, e encontra-se agora à janela do seu quarto.

E aproveito para publicitar também um blog onde colabora outra pessoa conhecida, Hugo Alves, que é adepto do Fêquêpê e sabe latim (Primeira Catilinária, I,2). Duas coisas a seu favor, portanto.

quinta-feira, dezembro 01, 2005

Luta de classes

Chavs

Sloaneys

Alguém devia fazer isto para Portugal; até porque, se todos sabemos quem são os equivalentes nacionais dos sloaneys, com os chavs é um pouco mais difícil: os dreads suburbanos? Os chungas condutores de chaços tunizados do Interior norte e centro?

segunda-feira, novembro 21, 2005

Não se pode dizer bem de ninguém

Como é do do conhecimento público, Roberto Heras, vencedor da Vuelta deste ano e aclamado como herói neste mesmo blog no dia 12 de Setembro, acusou EPO na amostra de sangue que lhe foi extraída após o último contra-relógio da prova.

A contra-análise vai ser realizada esta 5ª feira. Em 95% dos casos, confirma os resultados da análise inicial.

Roger Federer, também glorificado na mesma entrada, não está acusado de doping - apenas de mau gosto na escolha da namorada.

Conclusão: não se pode dizer bem dos vivos porque se corre o risco de eles ainda virem a fazer asneiras destas. E nem se pode dizer bem dos mortos, não vá aparecer uma "biografia não autorizada" que divulgue factos chocantes sobre o nosso herói (que sodomizava os filhos e batia no cão - ou vice versa -, que ouvia Shakira, que era adepto do Benfica, and so on and so forth).

quarta-feira, novembro 02, 2005

Especial Presidenciais 2006

Coragem, portugueses!

Até a Maria Sharapova está connosco:

Masha

quarta-feira, outubro 26, 2005

Vejam o que eu descobri no Google (Earth)

Maratona

Campo de batalha de Maratona (490 a.C.). Os atenienses e plateenses atacaram de oeste para leste na parte da planície mais próxima do mar e forçaram o que restou do exército persa ao reembarque.

Forte Douaumont

Forte Douaumont, em Verdun, perfeitamente visível no centro da imagem. Considerado o mais poderoso forte do mundo na época (1916), mas conquistado pelos alemães (24 de Fevereiro) e reconquistado pelos franceses (24 de Outubro) sem que em qualquer das ocasiões os defensores tenham oposto grande resistência.

Stalingrad

A actual Volgogrado, Estalinegrado em 1942-1943. A mancha verde no centro da cidade junto ao Volga é o antigo kurgan cita de Mamay, onde hoje se encontra a impressionante estátua da Mãe Pátria. Para nordeste, sempre seguindo o Volga, fica a antiga zona industrial, último reduto dos defensores soviéticos.

Prokhorovka

Campo de batalha de Prokhorovka (12 de Julho de 1943). O pionés marca a posição aproximada da vanguarda da 1ª Divisão Panzer SS Leibstandarte Adolf Hitler. Os 29º e 18º Corpos Blindados da Guarda do 5º Exército Blindado da Guarda Soviético atacaram vindos de Prokhorovka, no canto nordeste da imagem. A linha semicircular verde a noroeste marca o rio Psel; a 3ª Divisão Panzer SS Totenkopf encontrava-se a norte do rio e atacou para nordeste.
A sul da Das Reich na imagem encontrava-se a 2ª Divisão Panzer SS Das Reich, que foi atacada pelo 2º Corpo Blindado e pelo 2º Corpo Blindado da Guarda Soviéticos.

Bukrin e Kanev

Campo de batalha de Bukrin-Kanev (Setembro de 1943). O 24º Corpo Panzer alemão retirou da testa de ponte de Kanev (canto inferior direito da imagem) precisamente quando os soviéticos tentavam forçar a passagem do rio Dnieper (Dnepr) através de um assalto aerotransportado, em apoio das pequenas testas de ponte que tinham obtido na península de Bukrin no centro da imagem. Os pára-quedistas soviéticos (1ª, 3ª e 5ª Brigadas Aerotransportadas da Guarda) aterraram completamente dispersos por toda a metade inferior esquerda da imagem e acabaram por ser derrotados. O rio está hoje muito mais largo do que em 1943 devido à construção de uma barragem.

Abadia de Monte Cassino

A Abadia de Monte Cassino reconstruída. Os Aliados atacaram (Janeiro-Maio de 1944) vindos de Cassino (a povoação a leste da Abadia, visível na margem direita da imagem) e das montanhas a norte e nordeste. A noroeste da Abadia encontra-se actualmente o cemitério militar polaco (canto superior esquerdo da imagem). Num esporão rochoso no canto superior direito da imagem está o castelo de Cassino.

quinta-feira, outubro 20, 2005

Alguém sabe russo?

Boevoy Sostav, com quatro meses para 1942-1944 e dois para 1941 e 1945. Sou capaz de decifrar as coisas mais básicas (tipo гвардейская армия, резерва Ставки ou Стрелковые), mas temo que muito do resto me escape. Quando tiver tempo, vou deitar mãos à obra de qualquer maneira; este tipo de informação não tem preço.

segunda-feira, outubro 17, 2005

Vida artística

O artista, em tempos

Mendiga uns bocados de carvão à concierge para manter o lume da salamandra aceso e aquecer ao menos um pouco a decrépita mansarda parisiense onde passa os seus dias de tísico. Quando volta do bistro onde emborcou uns cálices de absinto, cruza-se nas escadas com emigrados polacos, fidalgos arruinados e sifilíticos e cortesãs decadentes. Tenta manter-se vivo pelo tempo necessário para terminar o livro de poemas/série de quadros que lhe trará a glória imortal. Escreve panfletos anarquistas.
Quando encontra outro artista em que vê a visão e o talento para alcançar o sublime e a transcendência, encoraja-o e diz-lhe que não é forçoso que acabe como ele próprio.

O artista, hoje

Como quase todos os portugueses, ou é funcionário público, ou está ressentido por não o ser. Ou recebe subsídios públicos ou dá entrevistas lamentando-se por não os receber. Nessas entrevistas, manda também umas bojardas para mostrar que não se leva demasiado a sério e fala dos seus restaurantes preferidos no Algarve.
Ou é larilas, ou faz um grande esforço por tornar evidente que não o é. Mede a importância dos outros pela influência política que se vangloriam de ter e pelo tamanho da lista de gente que lhes deve favores. Tem um blog. Consome semanalmente cocaína de valor superior ao PIB de muitos países do Terceiro Mundo. Diz-se “desencantado com a política”, mas quando alguém o convida para ser mandatário, porta-voz ou assessor, aceita de imediato. Nunca trabalhou na vida.

quinta-feira, outubro 13, 2005

A batalha do rio Boyne e a morte do salvador de Portugal

Um dos últimos títulos da Campaign Series da Osprey é dedicado à batalha do rio Boyne (1690). Esta batalha, que decidiu a contenda pelo trono inglês entre Guilherme de Orange e Jaime Stuart, é hoje mais conhecida pelas marchas de comemoração provocatórias organizadas pelos protestantes da Irlanda do Norte e que invariavelmente terminam em pancadaria com os papistas.

Mas para um português, a principal razão para a relevância desta batalha estará talvez na morte do septuagenário Duque de Schomberg, que comandou brilhantemente os exércitos portugueses na fase final das longas e duras campanhas da Restauração. No rio Boyne, no entanto, Schomberg estava ao serviço de Guilherme de Orange, combatendo contra a França que em tempos servira. Os oficiais do Antigo Regime agiam um pouco como profissionais liberais, oferecendo os seus serviços a quem lhes pagasse independentemente da nacionalidade, e por vezes lutando sucessivamente de ambos os lados na mesma guerra - foi o caso de Blücher na Guerra dos Sete Anos, por exemplo - embora a razão da mudança de lado do protestante alemão Schomberg tenha estado na revogação do Edicto de Nantes por Luís XIV.

Schomberg atravessou o rio Boyne à frente dos regimentos huguenotes do exército protestante anglo-holandês e terá sido morto por um tiro de pistola de um cavaleiro irlandês.

Biografia de Schomberg, por Manuel Amaral

Portugal deve-lhe tanto como a Nuno Álvares Pereira.

sexta-feira, outubro 07, 2005

Especial Autárquicas 2005

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Meias finais! Meias finais!

sábado, outubro 01, 2005

Adriaanse: ingénuo ou matreiro?

Deixei de comentar o trabalho de treinadores de futebol desde que, mais ou menos pela mesma altura:

- disse que trazer Scolari para a selecção era uma excelente ideia

- pensei que o FCP estava a cometer um erro ao contratar José Mourinho e que a melhor opção teria sido Jaime Pacheco (!)

Errare humanum est, mas desde então tenho a precaução de nunca me pronunciar de maneira categórica sobre nenhum treinador. E abro esta mensagem com palavras que não são minhas, e que ouvi a propósito de Co Adriaanse no final do jogo com o Rangers:

"Ele julga que ganha os jogos se marcar mais um golo que o adversário; joga com tudo ao ataque, pensando que, se sofrer um golo, não há problema que a seguir põe em campo mais avançados e marca dois ou três golos. É muito ingénuo."

Um bom retrato do actual estilo de jogo do FC Porto, mas "ingénuo"? Não é isso o que Adriaanse dá a entender nas suas conferências de imprensa, em especial na última. Adriaanse jogou bem com o complexo de inferioridade nacional, dizendo que quem critica o seu trabalho está a impedi-lo de trazer para Portugal um jogo mais ofensivo e espectacular, está a impedi-lo, no fundo, de melhorar todo o futebol português.

Portanto, quem contestar o estilo de jogo hiper-ofensivo que Adriaanse ensaia actualmente no Porto e as suas consequências práticas por vezes desastrosas está apenas a criar obstáculos à sua cruzada para melhorar a qualidade do futebol português e torná-lo mais agradável para o espectador, "como se vê lá fora".

Co Adriaanse está em Portugal há pouco tempo, mas já mostrou entender bem o perfil psicológico dos jornalistas e adeptos e como manobrá-los e colocá-los na defensiva, na obrigação de justificarem as críticas que lhe fazem, quando o normal seria que fosse o treinador holandês (sem grande currículo, sublinhe-se) a justificar as suas discutibilíssimas opções aos adeptos do clube que o contratou em busca de resultados, e não de belas exibições.

"Ingénuo"? Eu diria "matreiro".

Update

O Sol dos Scorta é mesmo muito mau.

E está todo escrito assim. Em frases curtas. Muito curtas. E redundantes. O leitor não precisa de se esforçar. O autor também não se deve ter esforçado. Se era para isto, mais valia ler alguma coisa de Chuck Palahniuk. Que também só usa frases curtas. Mas ao menos é mais cool. E tem palavrões.

E tem outro problema mais grave - no meio de todos aqueles lugares comuns banais e gastos de conto de jornal de parede de liceu, nada acontece. Não só está mal escrito como é um tédio. Os leitores habituais destes romances fatelas esperam algo de túrgido, esperam crimes e sexo sujo - que não vão encontrar aqui.

A pergunta passa a ser: a quem se dirigem então livros como este?

Ao menos isto: mesmo os que mais detestam Michel Houellebecq não poderão dizer, caso La Possibilité d'une Île ganhe o Goncourt, que o seu livro é o pior Goncourt dos últimos anos.

domingo, setembro 25, 2005

"Põe-lhe uma capa gira"

Haverá algum significado particular para as capas das várias edições do best-seller aparentemente algo medíocre que venceu o Goncourt do ano passado?

Em França, uma velha encarquilhada:

Edição original francesa

Na tradução inglesa, uma meridional curvilínea e seminua:

Edição americana

Na tradução portuguesa, um castiço de bóina:

Tradução portuguesa

É compreensível que os yanks tenham pensado que a morenaça (ou, para usar daquelas palavras que só se encontram nos romances, a "trigueira") seria mais apelativa que a víuva com ar ameaçador. Já a capa portuguesa é mais difícil de interpretar. Tudo o que me faz lembrar é o Quim do "Quim e Filipe".

Quanto ao livro em si, vou ver se é tão mau como o Libé disse.

quinta-feira, setembro 22, 2005

Legião Portuguesa - com as águias de Napoleão

No site de Manuel Amaral encontra-se uma breve narrativa de uma das mais espantosas, e negligenciadas, epopeias da história de Portugal: a Legião Portuguesa.

A Legião Portuguesa, por Ribeiro Artur

Junot reuniu em 1807 um corpo de oficiais e soldados do exército regular português dissolvido. Esse corpo, de cerca de 6.000 homens, recebeu o nome de Legião Portuguesa, e foi integrado na Grande Armée, tomando parte nas grandes campanhas de Napoleão.

A Legião Portuguesa distinguiu-se em Wagram (1809), combatendo com o II Corpo de Oudinot (3ª Divisão, Gen. Grandjean) no ataque a Baumersdorf.

Na campanha de 1812, a Legião participou na conquista de Smolensk e na batalha de Borodino, desta vez sob as ordens do marechal Ney (III Corpo). No assalto às flechas (redutos) Bagration, no centro das posições russas, a Legião perdeu mais de 500 homens. Só 100 soldados, de um total de 5.000 que iniciaram a campanha, sobreviveram à retirada de Moscovo, aos ataques dos perseguidores cossacos e à passagem do rio Beresina.

A Legião Portuguesa na campanha de 1812

Dúvida metafísica do dia

Elena Dementieva é mesmo parecida com Paris Hilton, ou é só o pescoço comprido?

segunda-feira, setembro 12, 2005

Self-loathing sim, mas sem estrangeiros

Muito me espantaria se existisse em todo o mundo um país que faça do desprezo por si próprio enquanto povo um passatempo nacional como Portugal o faz. Temos colunas de jornal e - suponho - sei lá quantos blogues, cuja única finalidade é, semana após semana, dizer aos portugueses que são todos preguiçosos, incultos, corruptos, desorganizados, mal educados, and so on.

(Abrindo aqui um parêntesis para uma breve digressão, é curioso que preguiçosos, incultos e com falta de civismo sejam sempre e apenas os outros - aquela massa anónima de portugueses da qual o autor das críticas tem sempre a precaução de se excluir; este self-loathing não implica que os portugueses que a ele se dedicam deixem de ter a melhor opinião possível sobre si próprios e entender que, individualmente, a sua conduta é irrepreensível, e não assumam nunca qualquer responsabilidade pessoal pelo estado em que o país está).

Mas o caso muda radicalmente de figura quando essas críticas surgem vindas do estrangeiro. A reacção é completamente desabrida; exige-se guerra total e sem tréguas contra o país autor da ofensa, ou pelo menos o assassínio selectivo do autor do texto, do seu editor e de todos os que possam tê-lo lido.

Aconteceu novamente, desta vez com um artiguinho (que até é ocasionalmente engraçado) publicado no Sunday Times no qual se fazia a crítica ao restaurante português Tugga.

Claro que é um pouco irritante que aos ingleses nem lhes ocorra que a sua própria xenofobia é um defeito, e não uma excentricidade enternecedora para utilizar em colunas de jornal ligeiramente sarcásticas. Mas porque razão não ouvimos este escarcéu todo quando algum colunista - ou paineleiro de programa de debate na TV - de produção nacional escreve ou diz o pior sobre Portugal ou os portugueses (com razão ou sem ela, não é isso que está em causa), coisa que acontece todos os dias?

Rei Roger, mas o herói do dia é outro

Federer

Rei Roger, é claro; mas o grande herói de hoje foi Roberto Heras. Com 15 pontos no joelho esquerdo em resultado de uma terrível queda na 5ª feira, deu um banho a toda a concorrência numa subida sob chuva, temperatura inferior a 10º e visibilidade de cerca de 10 metros no topo, a mais de 1400 metros de altitude. Venceu a etapa e é de novo camisola dourada.

Heras à frente, seguido de Samuel Sanchéz e Javier P. Rodriguez

O Rei Roger já é, aos 24 anos, um dos melhores jogadores de ténis de todos os tempos, e todos gostamos de o ver ganhar. Mas quem é mais merecedor de admiração?

sábado, julho 30, 2005

Pausa

Novidades em meados de Setembro.

sexta-feira, junho 24, 2005

Arqueologia militar

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A arqueologia militar é uma actividade extremamente perigosa e consequentemente desaconselhada, dadas as quantidades prodigiosas de granadas por explodir que a pá dos investigadores/aventureiros se arrisca a encontrar.

Cerca de 900 toneladas de munições por explodir são anualmente recuperadas de antigos campos de batalha da 1ª Guerra Mundial em solo francês. Calcula-se que, ao presente ritmo, ainda sejam necessários 700 anos até que todas essas munições sejam desenterradas e neutralizadas.

Na Frente Ocidental, a frente de batalha manteve-se praticamente estática durante dois, três ou mesmo quatro anos. Como dizia o Capitão Black Adder, "a frente tinha tão poucas probabilidades de mudar de sítio como um francês que vivesse ao lado de um bordel". Dezenas, senão centenas de milhares de projécteis foram despejados em colinas com algumas dezenas de metros de elevação e zonas da dimensão de campos de futebol, e as mesmas trincheiras foram ocupadas durante vários meses ou anos. Assim, é fácil compreender que os antigos campos de batalha estejam pejados de detritos bélicos de toda a espécie.

Na 2ª Guerra Mundial, a muito maior extensão dos teatros de operações e a mobilidade das frentes de batalha não permitiu que se acumulassem tantos vestígios dos combates num mesmo local.

Pelo menos era o que eu pensava.

O link que se segue leva a uma expedição de arqueologia militar na região de Kiev, da autoria de Elena Filatova:

A muralha da serpente

O número e qualidade dos achados dos combates, relíquias dos combates por Kiev no verão de 1941, e mais tarde da batalha pela travessia do Dnepr em Setembro-Novembro de 1943 e da batalha da bolsa de Korsun, é surpreendente.

domingo, junho 19, 2005

Gary Brecher em grande rotação

Gary Brecher dedica a sua coluna no Exile de 3 de Junho ao fenómeno Zarqawi.

Gary Brecher pensa que Zarqawi existe mesmo, mas que não tem a relevância que ambos os lados em conflito lhe atribuem - tanto para uns como para outros é conveniente imputar as culpas (no caso americano) ou celebrar o heroísmo (no caso da Al-Qaeda) da resistência iraquiana (que é na sua esmagadora maioria espontânea) a um único estrangeiro (no caso americano) ou a um único dirigente da organização (no caso da Al-Qaeda).

Passamos a citar:

(...)both sides want to make the Iraq insurgency a classic Mr Big story. Al Q wants to give its own lame, James-Bond multinational crew credit for what's actually a homegrown, neighborhood-based Iraqi uprising. The Pentagon wants to put a face-an outside agitator's face-on the car bombers. America will do anything to avoid having to face the most obvious fact about Iraq: they hate our guts, all of them. Pasting Zarqawi's face all over the net also hides the fact that our so-called intelligence units still don't know a damn thing about the insurgency. It makes it seem as if we're hot on the trail of the one demon responsible for the whole mess.

No meio de oceanos de propaganda e "analistas de segurança e defesa" mercenários, onde é que vamos encontrar análise lúcida e isenta? Escrita por um amador, em linguagem desbragada, num 'zine ranhoso que só encontrei na WWW por acaso.

terça-feira, maio 31, 2005

Feira do Livro e grau de coolness das editoras

A Feira do Livro de Lisboa traz consigo uma série de impressões vívidas: barracos. Calor. Capas coloridas, encarquilhadas pelo calor. Muito calor. Grande concentração de meninas em idade universitária e trajes reveladores por causa do calor. Já falei no calor?

Mas acima de tudo, a Feira do Livro é democrática. Todas as editoras, ricas ou pobres, publiquem James Joyce ou Paulo Coelho, cool ou uncool, estão instaladas nos mesmos barracos miseráveis de campo de refugiados. Para ser um cenário de catástrofe humanitária, só faltam os cães coxos, a tenda da AMI e o panelão de arroz ao lume; as moscas e o calor já lá estão.

O que nos leva ao tema de hoje: editoras cool e uncool.

Existe uma verdadeira hierarquia das editoras em função do prestígio que, com razão de ser ou não, lhes está associado. Em termos de imagem social, é fácil de detectar em certas pessoas uma relutância em admitir que se adquiriram livros desta ou daquela editora, enquanto que outras surgem sistematicamente nas listas de livros recomendados pelos críticos da especialidade.

Um exemplo: é possível comparar a Assírio e Alvim, com as suas edições de poesia e lombadas negras, com a Europa-América, com os seus livros de bolso baratuchos e as suas colecções de livros práticos sobre os temas mais bizarros? É como comparar um Bentley com um Fiat Punto.

O que se segue é uma tentativa de fazer um levantamento das editoras cool e uncool de Portugal, tendo em conta os seguintes indicadores:

Editoras cool:

Capas com design austero e minimalista, normalmente quase idêntico para todas as publicações da editora

Publicação de obras (por vezes merecidamente) obscuras

Capas das quais consta "traduzido do swahili/búlgaro/kimbundu/qualquer outra língua invulgar por"

Publicação de longamente aguardadas e muito elogiadas novas traduções que por vezes poucas diferenças têm das já existentes em editoras menos cool (case in point o Proust de Pedro Tamen)

Editoras uncool:

Publicação de literatura light ou literatura de género (romances históricos para o povão, ficção científica ou romances policiais)

Capas agressivas

Associação a classes sociais menos cool

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Seguem-se exemplos:

Editoras cool

Cavalo de Ferro (a mais cool de todas; as suas edições são entusiasticamente discutidas nas capelinhas meses antes de serem lançadas no mercado)

Guimarães

Assírio e Alvim

Relógio d’Água

Cotovia (capas minimalistas e as novas traduções de Homero)

Presença (tem aquelas novas traduções dos russos)

Gradiva (se não é cool, devia ser; o melhor logo de Portugal, em qualquer ramo de actividade)

Editoras que podem ser cool ou não dependendo da vossa orientação política

Caminho (editora proletária)

Verbo (editora reaccionária)

Editoras uncool

Europa-América (já os merdas dos meus professores de liceu chamavam a atenção para as "más traduções" das PEA)

Círculo de Leitores (foi durante anos o único meio de acesso ao livro das classes médias suburbanas; serviu para decorar inúmeras salas de estar e encheu estantes inteiras de livros que ninguém leu)

Livros do Brasil (por causa das hediondas capas da colecção "Dois Mundos", e pela política de reedições: reimprimem Pearl Buck, mas não Thomas Mann?!?)

Oficina do Livro (publica Margarida Rebelo Pinto; é preciso dizer mais?)

Terramar (nasceu num vão de escada de Mem-Martins, de onde num certo sentido nunca saiu, e o seu primeiro grande êxito editorial foi a série "Onde Está Wally?", uma das mais incompreensíveis modas do início dos anos 90)

Quetzal (nos meus tempos de estudante - i.e. quando não havia paperbacks e os livros eram octavos, quartos ou folios - a Quetzal era bastante cool e publicava autores como Pascal Quignard; hoje reconverteu-se em editora de literatura light e "temas da actualidade")

Âmbar/Texto Editora/Porto Editora (e todas as que produzem material ou livros escolares)

Anúncio gratuito

Uma forma de agradecer às pessoas cujos blogs me acabaram por convencer da necessidade de eu próprio iniciar um.

Mel com Cicuta

Uma visão sarcástica e misantrópica da vida urbana e da política actuais, com o sentido de humor politicamente incorrecto que se reconhece à autora. Quase que lhe perdoo o ser reaccionária e gostar de Mark Rothko.

Convicções

Apesar de apoiar entusiasticamente e à partida quaisquer perseguições aos herejes que Bento XVI entenda iniciar, não deixo de dar aqui um espaço a convicções religiosas alternativas. Inclui ainda poemas e comentário sobre temas actuais.

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Quer ver o seu blog publicitado no Marsch, marsch!, blog de grande notoriedade pública, elevadíssimo número de leitores, e o preferido das classes A e B?

Dirija a sua proposta para Avenida dos Sacanas Gananciosos e das Comissões de 10%, 21. Facilidades de pagamento. Aceitam-se Visa, Mastercard, American Express, cargos escandalosamente bem remunerados em gabinetes ministeriais ou empresas do sector público, viaturas oficiais diversas e apartamentos em Monte Carlo. Prostitutas brasileiras de bar de alterne compram, quando muito, um árbitro da 2ª B.

terça-feira, maio 17, 2005

Espírito de contradição e muita paciência

Ser adepto do FC Porto fora do habitat natural dos portistas demonstra espírito de contradição e exige muita paciência. Ao longo dos anos, vi-me na obrigação de justificar não ser adepto do Benfica ou do Sporting, como todos os bons portugueses aparentemente são, uma média de 10 vezes por dia. Mas mais ainda - há também que defender o FC Porto de ataques de gente que lhe tem quase tanto asco como o Saldanha Sanches tem pelas autarquias locais.

Das centenas de discussões que tive, posso classificar os FC Porto-fóbicos em quatro categorias básicas:

Aqueles para quem dá muito trabalho pensar

Estes são os que, quando confrontados com as vitórias nacionais e internacionais do FC Porto, e com as falcatruas e favorecimentos de que os seus próprios clubes beneficiaram e beneficiam, abandonam a discussão encolhendo os ombros e dizendo: "Não interessa - o Pinto da Costa é que compra os árbitros todos."

Os Indignados

Para estes, as vitórias do FC Porto são ofensas pessoais. Muito pessoais. Quando sabem que sou adepto do Porto, enxofram-se e, de indicador apontado à minha cara como uma arma, bradam "Como é que explicas que...", e começam o rol das intoleráveis desonestidades em que assenta o domínio do futebol português pelo FC Porto nos últimos anos, bem como os repetidos e humilhantes insucessos do seu próprio clube. A estes, deixo-os esvaziar a sua fúria. Antes em mim do que na estrada, nalgum condutor que notem que tenha um galhardete do FCP pendurado no retrovisor, ou nalgum GNR com pronúncia do Norte.

Os Abstrusos

Esta categoria corresponde mais ou menos à dos espectadores fiéis de programas de paineleiros de futebol. Lêm todos os diários desportivos sem falhar um número e têm uma capacidade impressionante para apreender uma série de factos inúteis, que arquivam para uso no que entendem ser o momento adequado. Quando chegam ao momento de apresentar os seus argumentos, lá salta do seu arquivo alguma contratação de há quinze anos atrás, uma percentagem de empresário, obscura trica ou insignificante alteração de regulamentos da Federação ou da Liga na qual, asseveram, houve mão de Pinto da Costa.

Palma de ouro nesta categoria: um colega de liceu que, para demonstrar que "lá no Norte é só corrupção", explicou como os árbitros da AF do Porto podiam ser indicados como candidatos para promoção a árbitros internacionais desde que tivessem o 9º ano de escolaridade, enquanto a AF de Lisboa exigia o 12º ano.

Os Moderados

O grupo mais exasperante, num certo sentido. Depois de me ouvirem pacientemente - e por vezes até acenando com a cabeça em sinal de concordância - enquanto demonstrava que todos os grandes são beneficiados pelas arbitragens nos jogos contra os clubes pequenos, fazendo-me acreditar que, pela primeira vez na vida, tinha conseguido convencer alguém, dizem "Sim, é verdade, mas tens de admitir que o FC Porto é mais beneficiado".

domingo, maio 15, 2005

O Jornal da Tarde

Como o subtítulo deste blog também faz referência a "assuntos do interesse das massas populares", e para demonstrar que posso ser um tótó da História Militar, mas ao menos sou um tótó ecléctico, segue-se a primeira tentativa de uma mensagem de interesse geral.

O tema é o Jornal da Tarde (todos os dias na RTP1 às 13:00).

A maior parte dos defeitos do Jornal da Tarde são comuns a todos os serviços informativos da TV portuguesa: directos sem qualquer razão de ser de locais onde já nada acontece (porque não gravá-los alguns minutos antes, e evitar os riscos do ad lib?), "jornalistas" que põem as respostas na boca dos entrevistados (porque raio os entrevistam sequer, então?), cobertura de irrelevâncias que nem aos jornais regionais interessam, e uma duração totalmente injustificada, na maior parte ocupada com questionários a transeuntes e a habitantes da parvalheira em causa, que invariavelmente descrevem os seus vizinhos psicopatas como "pessoas pacatas".

Mais valia noticiar o que fosse efectivamente notícia (o que, em Portugal, se despachava em cinco minutos) e depois anunciar: "Como em Portugal felizmente nunca se passa nada, vamos ocupar o resto do tempo deste telejornal com imagens de um gatinho a brincar com um novelo de lã/câmaras ocultas num balneário de mulheres algures na Escandinávia/uma selecção dos melhores golos do FC Porto nas últimas dez temporadas".

Mas o Jornal da Tarde inclui dois motivos de interesse adicionais:

Paula Rebelo, uma mulher aterradora com cara de ovelha, um penteado que esperaríamos ver num bar de alterne em Cabeceiras de Basto, voz cavernosa e pronúncia inenarrável ("Estes exames são fawitos") que quase todos os dias e infalivelmente ao fim de cerca de 20 minutos do noticiário, nos aparece com uma "reportagem" do Hospital de São João sobre algum revolucionário método de lavagem das fronhas das almofadas ou sobre as falhas do quadro de electricidade na Cirurgia II. Haja ou não haja algo que valha a pena reportar, oportuna ou inoportunamente, faça chuva ou faça sol, Paula Rebelo lá está. Enfim - suponho que seja mais fácil do que andar à procura da notícia.

Alberto Serra, mecânico de automóveis de formação, animador cultural nos tempos do PREC e antigo jornalista regional, que prodigaliza a respeito dos assuntos mais triviais tiradas líricas e trocadilhos patetas que até ao espectador provocarão embaraço, tudo transmitido com as ênfases e pausas dramáticas de um actor de grupo recreativo de província. Pelas suas próprias palavras: "Os factos apenas dão das pessoas o exterior, para lhes captar a alma é preciso a literatura e a poesia". Pensem nos justamente celebrados chavões de Gabriel Alves, multipliquem por dez mil e nem chegam perto.

Alberto Serra: um repórter para além da espuma dos discursos

Eu tenho fé na evolução da Humanidade. Espero que, daqui a cinco ou dez anos, tudo isto pareça penoso, ridículo, quase inacreditável.

Mas entretanto, vejam e desesperem.

Coming up next: Ingres como retratista; porque razão 95% da História Militar da Antiguidade Clássica é pura perda de tempo; Feira do Livro; Primeira Guerra Mundial: o revisionismo em marcha; reflexão sobre os introvertidos a propósito de uma passagem de Proust; fui aos subúrbios e sobrevivi para contar a história; novidades da Osprey Campaign Series; Giorgio de Chirico; paineleiros do futebol; demonstração de como as colunas de João Carlos Espada são afinal finos exemplos de sátira; and many, many more.

sábado, maio 14, 2005

Clibanarius?

Cada vez há menos desculpas para a ignorância. Hoje em dia, não há quase nenhuma dúvida que uma busca no Google ou a Wikipedia não esclareçam.

O significado da palavra Clibanarius parece ser uma das excepções. Quando introduzida num motor de busca, o resultado é uma lista de sites sobre uma espécie de caranguejo eremita.

Daí que seja preciso dar uns links para artigos que esclareçam o que era, afinal, um clibanarius.

Artigo Wikipedia sobre catafractários; os clibanarii eram uma modalidade de catafractários.

Artigo da Wikipedia alemã sobre clibanarii, com links para páginas com imagens (na maior parte ilustrações de Angus McBride roubadas de livros da Osprey).

E uma reconstituição moderna de clibanarii romanos:

Clibanarii romanos


Enquanto buscava artigos e imagens na WWW, encontrei um daqueles sites de entusiastas que só podem ser feitos por quem tem tempo livre a mais:

Satrapa1

Tem vários artigos sobre temas invulgares e pouco tratados de História Antiga, em particular de História Militar, e a apresentação gráfica é faustosa (i.e. tem bonecos e mapas muito giros).

sexta-feira, maio 13, 2005

Gary Brecher

O 'zine Exile é publicado em Moscovo por expatriados americanos desde meados dos anos 90.

Entre outros assuntos de interesse óbvio para o entusiasta de História Militar como levantamentos dos melhores points de prostituição de luxo em Moscovo, o Exile conta com o que só pode ser um dos melhores colunistas de assuntos militares da WWW.

O título da coluna diz tudo: The War Nerd. O autor(?) dá pelo nome de Gary Brecher, e apresenta-se como um escravo de cubículo obeso, sexualmente frustrado e mal cheiroso residente em Fresno. Como já vi sugerido algures, trata-se muito possivelmente da capa para um trabalho colectivo dos editores do próprio Exile.

"Gary Brecher" é daqueles entusiastas tótós que se diverte genuinamente com a guerra. Os seus artigos transbordam de invectivas coloridas, coloquialismos americanos e sarcasmo com a subtileza de uma carga de tijolos. Mas de toda esta chocarrice e aparente infantilidade resultam algumas linhas de fundo bem perspicazes: a guerra como nós a vemos nesses odiosos documentários triunfalistas sobre os aliados ocidentais na 2ª GM, a guerra entre Estados e exércitos regulares obedecendo a um Direito da Guerra, codificado ou não, e a propósitos políticos bem definidos tal como a conhecemos desde meados do século XVII, é a excepção, e não a regra. A regra é que a guerra é violência anárquica e sem sentido, que surge quase espontaneamente e que ninguém controla. É uma ideia que se pode encontrar em Kalevi J. Holsti, por exemplo.

Gary Brecher não rejeita qualificar como guerra o conflito sem início e sem fim na zona dos Grandes Lagos, onde as forças "militares" não têm objectivos estratégico-militares e muito menos político-estratégicos definidos e vivem do que conseguem roubar aos civis. Antes do surgimento dos Estados soberanos na Europa, todas ou quase todas as guerras assumiam estas características, e pouco ou nada as separava do banditismo.

Daí que Gary Brecher caia num certo amoralismo: não o chocam minimamente o terrorismo sistemático dos insurrectos iraquianos, ou o recurso a represálias, assassinatos ou a "guerra suja" da parte de americanos ou israelitas. Neste ponto, Brecher é totalmente coerente. Tough shit - guerra é guerra, venham as atrocidades do lado americano ou dos jihadis.

Um pouco como sucede como Michel Houellebecq, temos aqui um autor (?)que faz de tudo para chocar, para épater le bourgeouis. Mas o que ele tem para dizer - e não tenham dúvidas, ele tem muito para dizer - dá que pensar.

Arquivo War Nerd